Por Flávio Azevedo
Minha família é no mínimo pitoresca. Minha mulher é pernambucana, mas mudou para São Paulo quando pequena e adotou Sampa como sua, mas sem deixar as raízes nordestinas de lado, hoje ela é a paulista mais pernambucana que eu já vi. Eu sou carioca e mudei para São Paulo para me casar com ela, mas jamais deixei meu jeito malandro-carioca de lado. Ou seja, nossa casa é uma babel de sotaques, culturas e temperos. No último domingo resolvemos convidar uns amigos para um almoço nordestino em casa, era uma boa chance dela relembrar suas raízes e uma excelente chance de eu me ferrar. (Ops! Luz vermelha piscando). O domingo começou cedo, ela levantou toda espuleta gritando “vamos ao mercado, já são 9h e eu não comprei nada para o almoço, anda, levanta”. Eu só conseguia pensar onde estava o botão que desligava aquele despertador de voz fina. Como não encontrei o botão, só me restou levantar emburrado por ser acordado cedo em pleno domingo!
No mercado o meu único papel foi o de empurrar o carrinho e dividir a conta do mercado. Ela corria de um lado para o outro, me mandava pegar o coentro (COENTRO, o que é um COENTRO pelo amor de Deus? Desde quando isso existe? É de comer?), depois de 10 minutos procurando, apelei para os universitários e consegui achar o tal do coentro.
Já em casa, com sacola para todos os lados, panelas e facas nas mãos ela incorporou o Hitler que existe dentro daquele ser de apenas 1,63m e mandou ver.
O cardápio escolhido foi carne seca acebolada, farofa de ovos, purê de macaxeira (aprendi a falar pernambuquês com ela), arroz e feijão fradinho no vinagrete.
Acontece que o cardápio escolhido por ela (guardem isso, ela escolheu) era trabalhoso e depois de uma hora na cozinha começou a bater o desespero na coitada, achando que não ia dar tempo de acabar tudo antes das visitas chegarem.
Eu, que não sei cozinhar nada além de miojo, depois de ouvir alguns gritos de desespero, me prontifiquei a ajudar.
“Você quer me ajudar? Então corta tomate, cebola e pimentão. BEM PEQUENO OK! Mas corta ali, sentadinho, nada de ficar andando pela minha cozinha!”
Muito obediente, sentei no banquinho lá no canto e pacientemente cortei tudo. Claro que demorei quase uns 40 minutos para isso, enquanto ela resmungava um dialeto estranho ao esmagar o aipim (na minha terra macaxeira é aipim) para fazer o purê. Claro que ela é muito mais rápida que eu e no fim o almoço ficou pronto a tempo.
Entre mortos e feridos, salvaram-se todos. O saldo do foi ótimo, mas assim que as visitas saíram ela virou pra mim e disse “nunca mais eu invento um cardápio nordestino em toda minha vida, aproveite bem os restos, nunca mais vou fazer isso, oh trabalho do cão”.